26.5.08

Centaurea

Centaurea sphaerocephala (Abril - Guincho)

DERIVA VIII

Vi as águas os cabos vi as ilhas
E o longo baloiçar dos coqueirais
Vi lagunas azuis como safiras
Rápidas aves furtivos animais
Vi prodígios espantos maravilhas
Vi homens nus bailando nos areais
E ouvi o fundo som das suas falas
Que já nenhum de nós entendeu mais
Vi ferros e vi setas e vi lanças
Oiro também à flor das ondas finas
E o diverso fulgor de outros metais
Vi pérolas e conchas e corais
Desertos fontes trémulas campinas
Vi o rosto de Eurydice das neblinas
Vi o frescor das coisas naturais
Só do Preste João não vi sinais

As ordens que levava não cumpri
E assim contando tudo quanto vi
Não sei se tudo errei ou descobri

Sophia de Mello Breyner Andresen

23.5.08

Uma Cantora Com A Voz Toda

Tivemos oportunidade de assistir a uma temporada para esquecer na sua quase totalidade. Valeu-nos a Tosca de Elisabete Matos para nos fazer lembrar que se pode, afinal, fazer ópera no Teatro de São Carlos: verdadeira encarnação da personagem, com a voz toda do princípio ao fim e uma interpretação de grande nível.
Já há muito tempo que se conheciam as suas qualidades vocais e lembro-me muito bem da sua Mimi, da sua Micaela, da sua Donna Elvira, da sua Santuzza, da sua Sieglinde, da sua Norma (no teatro romano de Merida). Mas, como Floria Tosca, Elisabete Matos aparece-nos com uma segurança nova, a segurança de quem tem vindo a amadurecer a personagem e a sua própria voz. Venha então a Turandot. E que venham Salome, Isolde, Brünnhilde. Ficamos à espera, ansiosamente.

(Mais não preciso de dizer; Jorge Rodrigues já disse tudo aqui.)

Elisabete Matos (Tosca) e Vladimir Vaneev (Scarpia)
(Tosca, I acto - Teatro Nacional de São Carlos)



(Newsletter)

VIVA ÓPERA
Um projecto do Teatro Nacional de São Carlos
com coordenação de Bruno Caseirão

26. MAIO 2008 FOYER DO SÃO CARLOS 18:30H
entrada livre limitada à lotação do Foyer

«1.ª PESSOA: O ARTISTA» com ELISABETE MATOS
No âmbito do Viva Ópera o Teatro Nacional de São Carlos propõe ao público um encontro com os artistas através de uma conversa conduzida por Bruno Caseirão.

ELISABETE MATOS, que tem obtido grande êxito na interpretação do papel titular da ópera Tosca, actualmente em cena no São Carlos, inaugura esta série de encontros, no próximo dia 26 de Maio.
Em conversa com Bruno Caseirão no ambiente informal e de convívio do Foyer do São Carlos, Elisabete Matos evocará alguns dos marcos mais importantes da sua carreira e experiência artística.

E-mail para informações ao público: vivaopera@saocarlos.pt

22.5.08

Jorge Rodrigues fala de Elisabete Matos

Elisabete Matos
(Tosca, II acto - Teatro Nacional de São Carlos)



"ASSIM, SIM!

Não é para me armar em bom, ou em esperto, ou coisa que o valha, mas caíram-me os queixos assim que ouvi Elisabete Matos pela primeira vez num papel de destaque (o que aconteceu no Festival Internacional de Música de Macau em 1993). Não porque estivesse a tentar dar agudos (convém descer os queixos e abrir a goela para o conseguir), mas porque fiquei espantado pela qualidade de uma voz que eu nunca tinha ouvido na sua plenitude. E a partir daí fiquei o que se chama “fan”.
Depois dessa aventura tive a felicidade de a ouvir em inúmeras outras ocasiões, e essa primeira impressão manteve-se, e em crescendo, até aos dias de hoje. Mas nestas coisas, por mais certezas que tenhamos acerca dos nossos julgamentos, nunca estamos seguríssimos dos mesmos. Quer dizer, falhar é humano, e eu sou muito gente. Até que ouvi a Elisabete na Tosca que foi cantada e representada no Coliseu do Porto numa iniciativa do Círculo Portuense de Ópera. E aí mandei às urtigas as dúvidas que pudesse ter acerca de mim próprio. Recordo-me que entrei em histeria – telefonei para toda a gente a dizer que era obrigatório ir ouvi-la, tentei fazer passar esse meu legítimo entusiasmo através de um programa de rádio de que eu era autor na Antena 2 (o Ritornello), e preparei-me para a ouvir onde pudesse. E então foram viagens para o estrangeiro (estou a recordar uma Sieglinde em Sevilha, de cair para o lado, e as vicissitudes que a rodearam. Eu, a Isabel, o Nuno, a Ana Luísa, o António, a Manela, tudo a meter-se em carros, a voar até Sevilha, ouvir a récita, ir cear qualquer coisa a seguir, e vir logo a correr para Lisboa, onde todos tínhamos de trabalhar de manhã. Mas pensam que eu fazia uma coisa destas – eu e todos os que fomos – para ouvir uma ranhosa qualquer?). E foram também inúmeras as idas a concertos por esse país fora (Porto, Guimarães, vários locais em Lisboa, etc.). E a felicidade a continuar!
Havia um senão, enorme, em toda esta felicidade – Elisabete Matos continuava a não cantar em São Carlos um papel a sério; isto é, um daqueles papeis maiores que são oferecidos às divas (poucas pessoas há que merecem este tratamento, mas Elisabete Matos merece-o! – porque divas são as deusas que nos transportam emocionalmente para outras esferas). Um daqueles papeis que pela sua complexidade vocal e dramática só podem ser efectivamente defendidos por quem tenha um material vocal excepcionalíssimo e um material emocional que se traduz em representação de arromba. Embora os cantasse regularmente em palcos como os do Scala, do San Carlo de Nápoles, do La Fenice, etc., etc., etc. E ficava furioso por ela e por mim e pela minha geração: todos estamos prontos a gozar e a rir do modo como trataram Camões, do modo como trataram Viana da Mota, do modo como trataram N gente. E a nossa geração a cair no mesmo. E é isso que me custa, pois eu não quero que me confundam com essa gente que não vê um palmo à frente do nariz e cuja estupidez contamina uma geração inteira. Isto deixava-me absolutamente virado do avesso. Estava a repetir-se aquela merdosa atitude que é comum no nosso país – quem sobressai pela qualidade, zás, é logo atacado. E, invariavelmente, por gente miserável. É que quando me deslocava a Espanha e falava, por exemplo, com o Director do Teatro Real, lá vinha ele com a mesma conversa – “Elisabeta es nuestra!”. Obviamente, eu ficava orgulhoso, mas não deixava de pensar no estuporado país que permitia isto – ainda bem, por outro lado, que Elisabete foi para um país onde as coisas se levam a sério.
E lá começaram a dar-lhe, muito timidamente, alguns papeis em São Carlos – uma Santuzza, uma Sieglinde (mas em concerto), uns concertos, mas nada que enchesse o olho, sim porque eu gosto muito de ver uma siciliana a bater com as mãos no peito, mas aquilo acaba em um acto, não é? Quando começávamos a aquecer lá estava ela a lançar o agudo final e a agradecer. Assim não vale! Eu queria mais!
E surgiu esta Tosca estreada no mês de Maio de 2008! Em São Carlos! Aleluia!
Não há palavras para descrever o que eu – e todo o público – temos sentido. Digo apenas uma coisa: penso com toda a sinceridade que neste momento no mundo não há nenhuma Tosca superior ou comparável à de Elisabete Matos. Depois de ouvir a estreia fiquei imediatamente com essa certeza. Revi mentalmente os sopranos em actividade no mundo e, repito, nenhuma há que se lhe compare.
E passo a explicar.
Vocalmente falando Elisabete Matos está numa forma absolutamente excepcional. Sim porque a voz é de si excepcional, mas neste momento é uma excepcionalidade em forma excepcional. Os agudos da mulher! Há quem considere esta conversa dos agudos uma coisa superficial, simplista, e se ria de quem por eles se entusiasma – é gente muito superior a nós, infinitamente culta, com uma tal sensibilidade que não lhes permite aguentar tudo o que é força da natureza. Pois eu respondo-lhes: vão zurrar para outro lado. É que essa conversa da treta mais não é do que uma estupidez abissal, reles, e rasca – porque os compositores não colocaram essas notas impossíveis na partitura porque lhes apeteceu. Numa obra de arte – como são as óperas de Verdi, Puccini, Wagner, Bellini, Mozart, Strauss, Mussorgsky, etc. – tudo é orgânico e o facto de no III Acto a palavra “lama” (“lâmina”) ser dita com um dó agudo não é inocente, o facto de a Turandot ter de se lançar para a estratosfera ao cantar “Quel grido” não é inocente, o facto de a Azucena ter de lançar um si bemol ao cantar “sei vendicata o madre”, também não é inocente. Só perfeitas bestas é que não entendem isto. Mas infelizmente há bestas que zurram muito alto e muitas bestas há prontas a ouvi-las… O agudo é um elemento dramático e musical importantíssimo, fundamental, e ouvir uma Tosca que não tenha esse registo agudo seguro é o mesmo que ir ver um Benfica / Porto com os jogadores todos a coxearem. É que Tosca sem agudos é futebolista coxo, desculpem lá. Mesmo que não percebam o que eu digo, tentem decorar!
Mas não são só – obviamente – agudos! É todo um material vocal perfeitamente dominado, com uma igualdade esplendorosa, com um registo grave sem ser forçado e que arrepia pelo dramatismo que consegue imprimir a uma frase, é a construção da linha melódica, é a coragem. Sim, a coragem! Porque estar num palco é como estar num circo: há quem faça saltos mortais sem rede e há quem necessite de rede. Elisabete Matos canta sem rede, isto é, entrega-se toda ao papel e isso faz com que nunca se poupe. E isso é, acreditem-me, a melhor coisa que se pode ver – um artista que se dá todo em palco, sem pudor. Obviamente que para isso é preciso técnica, técnica e mais técnica (recordo sempre o que Edita Gruberova me disse uma vez: só a técnica liberta!), e ter alma, e mais alma, e mais alma.
E aqui chegamos ao elemento dramático, cénico. E a Tosca de Elisabete Matos também me desfez nesse aspecto. É um personagem perfeitamente pensado, coerente, sentido, verdadeiro. Ela consegue aquilo que poucas conseguem, isto é, faz-me acreditar naquilo que estou a ver. Sofro horrores por ela, estou aflito com ela, apetece-me no II Acto entrar pelo palco dentro agarrar no Scarpia e desfazer-lhe o focinho a pontapés. É isto, percebem, que eu gosto de sentir em ópera – comover-me até às lágrimas com o que vejo e ouço! E isso, meus amigos, só cantores excepcionais é que conseguem. Exemplos de total mestria dramática: o dueto de amor do I Acto, em que ela surge solta, alegre, feliz, e mesmo o arrufo “atavantico” é uma coisinha que percebemos ligeira; a entrada no II Acto, em que o gesto é lento, redondo, estudado, pensado, como um animal que está com medo que lhe façam mal; a expressão com que fica quando se deita no chão no final do mesmo II Acto. E no III Acto? A explosão de felicidade quando chega junto de Cavaradossi para lhe anunciar a “liberdade”. A mulher é de chorar!
E posto isto, e porque não quero maçar ninguém, fica aqui um conselho: não deixem de tentar ir a São Carlos antes do fim desta série de Toscas com a Elisabete Matos. Não deixem mesmo! Quem avisa, amigo é!"

Jorge Rodrigues

18.5.08

Cisnes

Os cisnes sagrados vogavam na floresta de Monsalvat, perto do templo do Santo Graal, quando Parsifal (o "tolo puro") disparou uma flecha e matou um deles, para grande tristeza do bom Gurnemanz. Também ele, Parsifal, não sabia que a beleza não se come.





Prelúdio do I acto de "Parsifal", de Richard Wagner (22 de Maio de 1813 - 13 de Fevereiro de 1883), pela Orquestra Filarmónica de Viena, dirigida por Sir Georg Solti.

17.5.08

Opus 111

(A invenção do jazz)

Claudio Arrau toca a sonata nº 32, op. 111, de Beethoven, em 1970.

1 - Maestoso - Allegro con brio ed appassionato
(googooeugene)

2 - Arietta: Adagio molto semplice e cantabile(Spexter1337)

16.5.08

Salgadeira


Atriplex halimus (salgadeira)

Por mim, não quero já missão nenhuma,

senão tal jogo de onda e mais onda,
a surpresa da espuma
e a profunda tentação de morrer em cada onda!

David Mourão-Ferreira

12.5.08

Temporada Gulbenkian 2008-2009

Já estão disponíveis os detalhes da programação: Alfred Brendel, Evgeny Kissin, Truls Mork, Susan Graham, Thomas Hampson, Olga Borodina...

(clique na imagem para aumentar)

11.5.08

Recital no Conservatório, 14 de Maio, 18h30

Almeida Garrett, por José Malhoa, no tecto do Salão Nobre
do Conservatório Nacional de Lisboa


No âmbito da petição “ALGUÉM ACUDA AO SALÃO NOBRE DO CONSERVATÓRIO, POR FAVOR!” e numa iniciativa conjunta do Fórum Cidadania Lx e da Escola de Música do Conservatório Nacional de Lisboa, realizar-se-á no próximo dia 14 de Maio, pelas 18,30h, no SALÃO NOBRE DO CONSERVATÓRIO NACIONAL de LISBOA, sito na Rua dos Caetanos, 23 a 29 (ao Bairro Alto) – Lisboa, um recital com a colaboração, entre outros, de:

ANTÓNIO ROSADO (ex-aluno da Escola de Música do CN), que tocará, de Debussy:
- La cathédrale engloutie, prelúdio
- Pour les arpèges composés, estudo
- Pour les cincq doigts, d'aprés Monsieur Czerny, estudo

JORGE MOYANO (ex-aluno da Escola de Música do CN), que tocará, de George Gershwin:
- Raphsody in Blue (versão para piano)

GLÓRIA DE MATOS (ex-profª da Escola de Teatro do CN)

MARIA DE JESUS BARROSO (ex-aluna da Escola de Teatro do CN)

Este recital é, essencialmente, dedicado aos destinatários da petição - Presidente da República, Presidente da AR, 1º-Ministro, Ministros da Educação e Cultura, Presidente da CML, Deputados e Vereadores - e Comunicação Social.
A entrada é, no entanto, livre (de acordo com a disponibilidade dos lugares).

(Do Guilhermina Suggia)

10.5.08

Elisabete Matos - Puccini

Vem a caminho a "Tosca", a estrear no Teatro de São Carlos no dia 15 de Maio. Elisabete Matos vai interpretar a personagem da cantora apaixonada e ciumenta nas primeiras seis récitas (cantou-a em vários teatros italianos, no Porto, em Tóquio [2006] e em Sevilha [2007]). Recentemente cantou Senta, de "Der fliegende Holländer" ("O Navio Fantasma"), também em Sevilha, e Elisabeth, de "Tannhäuser", em Barcelona. Para a próxima temporada está agendada a sua estreia no papel de Turandot, em Antuérpia, o que indica que Elisabete está cada vez mais dedicada aos papéis pesados de Wagner e Puccini, sendo o da princesa da China um dos maiores assassinos de sopranos de que há memória. Todos o sabem, ela seguramente também. Desejamos-lhe que vença a difícil provação.

In questa reggia, de "Turandot"

(berganzita)

Turandot:
In questa reggia, or son mill'anni e mille,
un grido disperato risonò.
E quel grido, traverso stirpe e stirpe
qui nell'anima mia si rifugiò!
Principessa Lou-Ling, ava dolce e serena
che regnavi nel tuo cupo silenzio
in gioia pura, e sfidasti inflessibile e sicura
l'aspro dominio, oggi rivivi in me!

Pure nel tempo che ciascun ricorda,
fu sgomento e terrore e rombo d'armi.
Il regno vinto! E Lou-Ling,
la mia ava, trascinata da un uomo come te,
come te straniero, là nella notte atroce
dove si spense la sua fresca voce!

O Principi, che a lunghe carovane
d'ogni parte del mondo qui venite
a gettar la vostra sorte,
io vendico su voi, su voi quella purezza,
quel grido e quella morte!
Mai nessun m'avrà!
L'orror di che l'uccise vivo nel cuor mi sta!
No, no! Mai nessun m'avrà!
Ah, rinasce in me l'orgoglio di tanta purità!
Straniero! Non tentar la fortuna!
Gli enigmi sono tre, la morte è una!

9.5.08

O senécio e as vizinhas



Senecio petasites

Tem origem no México e mora em Sintra, ao lado desta, em harmoniosa coabitação. Bem perto vive esta

Chaenomeles japonica (marmeleiro-do-Japão)

e mais esta

Fumaria capreolata (catarinas-queimadas)

e estas

Zantedeschia aethiopica (jarro) e Wisteria sinensis (glicínia)

3.5.08

Ivo Pogorelich

Ivo Pogorelich estará amanhã (4 de Maio) na Gulbenkian e no dia 6 de Maio na Casa da Música. O recital em Lisboa encontra-se esgotado mas ainda há alguns bilhetes disponíveis para o do Porto. Podemos escutar interpretações suas de Liszt, Bach e Chopin no seu espaço.

(O Grande Auditório de 2 de Maio também passa Pogorelich.)